quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

O Marketing da Leitura – A história de alguém que não gostava de ler (Cap. 3)

O Caminho de volta ao carro corria sob os seus pés como um tapete rolante que, automaticamente, o afastava dali em direcção a uma tarefa… que raio de nome. Sabia que o que estava em causa não era o nome, nem mesmo a tarefa, mas aquele tapete rolante que mecanicamente o empurrava para longe da visão da planície, naquele momento mais dourada que nunca, ruborizada pela luz de dois sois. Ai se os seus colegas pudessem ouvir os seus pensamentos naquele momento. Um sorriso clareou num rosto crispado, quando tomou consciência da gargalhada que dariam. Seria uma verdadeira festa.

Passou junto à casinha dos gelados e ao quiosque onde o seu olhar descontraído embateu de frente com o título em parangonas na capa de uma revista: “O futuro nas mãos de Maya” Lá estava ela na capa, a astróloga que em programas de televisão dava palpites sobre a vida dos famosos. Como podia alguém que conhecia o futuro dar apenas palpites? Haveria ainda que acreditasse naquilo?

Abanou a cabeça horizontalmente a cabeça em sinal de desaprovação, voltou olhar para o local onde tinha estacionado o carro e teve mais uma surpresa. No vidro frontal, bem preso sob uma das escovas de limpea, um pequeno quadrado de papel acabava de lhe estragar um resto de dia que não estava já nada bem.

Ali não era proibido estacionar e tinha a certeza de ter colocado dinheiro suficiente na famigerada máquina do estacionamento. Aproximou-se rapidamente, levou a mão à escova e retirou o papel. Suspirou longamente, afinal não era nenhuma multa. Leu pausadamente o papel duas vezes e por momentos pensou que se fosse uma multa pelo menos seria mais clara, menos enigmática.

Colocou o papel no interior do bolso, dentro da carteira e sem mais, decidiu seguir o caminho que ainda à pouco encravava nos passos que antes lhe metiam tanto medo, embraiagem, ignição, primeira…

Mas, novamente algo de estranho, o travão estava extremamente leve e o acelerador não movia um centímetro, seria o destino que me queria segurar ali, ou seria que queria fugir à tarefa? A custo arrancou, uma boa alma estava a ceder passagem, quanta simpatia, mas logo abriu pisca e preparou-se para estacionar, está explicado, queria o lugar.

Continuou, e buzinaram, só então saiu do transe, e olhando pelo retrovisor reconheceu o Peugeot 206 de cor escura. Era uma colega sua, talvez ela também acorrera àquele oásis que era a esplanada, para massajar o cérebro depois de um dia de cão, pelo vistos deixara a tarefa para depois. Saudou-a e continuou, entretanto o retrovisor devolvia imagens do estacionamento da colega, apenas uma palavra, "Quedrama!!!" Como é possível que uma alma tão grande, que transborda talento, estacione tão mal.

Alguns pensamentos inconfessáveis atravessaram, a passo de caracol, a sua mente. Como se não fosse suficiente, agora tinha mais um problema, um bilhete enigmático para desvendar.

Por momentos reconsiderou a hipótese de voltar ao quiosque e comprar a dita revista, mas rapidamente fincou os pés na realidade dos pedais, e sem mais hesitações que não fosse o pensamento que atormentava o final da tarde, rodou a chave na ignição.

Não entedia. Algo se passava com ele nesse dia...

Mas que poderia ser?

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