Destaque: «Promovida recentemente à condição de estrela da economia internacional, a China começa a mostrar ao mundo uma faceta menos conhecida e mais temível: a de conquistadora de mercados».
Conhecida pela sua capacidade aparentemente inesgotável de consumir, está a transformar-se num pesadelo para grande parte dos países pela voracidade com que produz. Nada menos que 75% dos brinquedos, 55% do calçado, metade das câmaras digitais e 35% dos telemóveis consumidos em todo o mundo são produzidos na China. São percentagens assustadoras, e o mais incrível, é que não param de crescer. Os chineses estão a conquistar o mundo. Quando o mundo dos negócios é sacudido por tamanho choque de capitalismo, o fundamental é saber como reagir. Mas qual a fonte de tamanha competitividade? A economia chinesa, dada a magnitude dos seus níveis de produção, consegue obter importantes e significativas economias de escala que lhe permitem colocar os seus produtos a preços bem mais competitivos em qualquer parte do mundo. Um dos factores que contribui para que esta consiga praticar preços tão competitivos é o custo da mão-de-obra. Com 1,3 biliões de habitantes, um quinto da humanidade, e com mais de 750 milhões de trabalhadores, a China conta com uma reserva quase inesgotável de mão-de-obra. Nos últimos cinco anos, 200 milhões de chineses migraram do campo para as cidades e foram incorporados ao sector dinâmico da economia, contribuindo assim para garantir salários bastante baixos. É este aglomerado populacional que permite compensar a vulnerabilidade chinesa associada à baixa produtividade do trabalhador, muitas vezes encoberta e disfarçada. No entanto, segundo um estudo desenvolvido pela empresa de consultadoria McKinsey, esta vulnerabilidade tem os dias contados. A China não é o primeiro país a conquistar mercados com base nos baixos custos. Antes dela, já Hong Kong, Coreia do Sul, Singapura, Taiwan e mesmo o Japão o haviam feito. Tal como aconteceu nestes países, esta estratégia faz parte do passado, já que um dos desígnios da China de hoje tem sido o incremento da produção com elevada incorporação tecnológica. O que sobressai no caso chinês é que o país parece preparado para disputar todo e qualquer mercado. E quando não o consegue com os seus próprios recursos, recorre à aquisição de empresas em sectores estratégicos, como foi o que aconteceu com a aquisição da divisão de computadores portáteis da IBM, em Dezembro de 2004, por uma empresa chinesa. A ofensiva terá de ser enfrentada com mudanças estratégicas profundas. Desde logo, apostar naquilo que cada país ou empresa sabe fazer melhor, ou seja, nas suas vantagens comparativas. Diferenciar-se com inovação e investimento em marketing é outra recomendação para quem quer continuar em “jogo”. No sector do calçado, o exemplo vem de grupos como a americana Nike, que detém a marca e a criação dos seus ténis, mas que subcontrata a produção, aproveitando o baixo custo onde quer que ele esteja, inclusive na China. Importantes empresas de calçado já começam também a estudar a partilha de centros de design e a compra conjunta de componentes de grandes fornecedores globais. É preciso que os empresários interiorizem que o mercado é o mundo inteiro, e que é importante que se comece a olhar para os concorrentes como parceiros. Outra linha de acção deverá passar pelo fortalecimento das cadeias de produção e de abastecimento e pela adopção de uma visão holística das mesmas. Cada parceiro de negócio deve ter a correcta percepção da sua importância para o resultado geral. Até porque, hoje em dia, a verdadeira concorrência acontece sobretudo entre cadeias de abastecimento e não tanto entre empresas isoladas. Também é necessário esquecer rapidamente conceitos ultrapassados. Por exemplo, para as empresas do sector têxtil, é fundamental abandonar a antiga prática de lançar duas colecções por ano. A oferta de novidades deve ser constante. A cadeia espanhola Zara lança novas colecções com uma periodicidade quinzenal, subcontratando empresas em todo o mundo. Isso, só é possível devido a uma óptima gestão da logística, principalmente pelo controlo dos níveis de stocks, sem que haja um comprometimento dos custos. Quem quiser continuar a competir com base em mão-de-obra barata tem o seu futuro comprometido.Igualmente importante é fazer uma prospecção do mercado chinês na procura de parcerias. “Se não consegues vencê-los, junta-te a eles”. A ideia consiste em aproveitar nichos de mercado não explorados pelos chineses e apostar no seu crescimento. É uma saída que tem sido procurada por empresas têxteis, empresas metalomecânicas e mesmo adegas cooperativas portuguesas. O avanço da China é mais uma evidência da incrível vitalidade de um país que, segundo a lógica do modelo em que o mais eficiente é que vence, lhes permite “estar um passo à frente dos outros” e montar um sistema económico que, para além de aproveitar o que tem de melhor, se encontra num processo de reciclagem assente num forte investimento em tecnologia e em educação e assim deixar de ficar eternamente preso a sectores de mão-de-obra intensiva.
Susana Garrido Azevedo
Publicado em 03/01/2006 no Jornal Diário XXI
terça-feira, 3 de janeiro de 2006
A concorrência dos produtos chineses
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