terça-feira, 4 de abril de 2006

Antídoto bimodal para as exportações chinesas



DESTAQUE: “Os EUA adquirem mercadorias à China e os Bancos da China adquirem títulos aos EUA. Em súmula, o arranjo contratual possibilita aos EUA financiarem o seu deficit externo e aumenta a procura por activos financeiros expressos em dólares”.




O bloco económico regional europeu tem vindo a registar sucessivos deficits comerciais com o parceiro comercial chinês. Para superar esta situação, estão a ser celebrados contratos de elevada dimensão em diversos sectores estratégicos relacionados com a produção de automóveis, de aviões comerciais, de comboios rápidos e de centrais eléctricas.

Urge superar a ideia tradicional de explorar as vantagens comparativas na posse do bloco europeu, em termos das especializações produtivas atrás referidas, com o objectivo de compensar os efeitos “aparentemente” devastadores das exportações chinesas de têxteis, plenamente enquadradas nas disposições constantes no General Agreement on Tarifs and Trade (GATT).

Para este efeito, deve equacionar-se como função de melhor resposta para o bloco europeu, a possibilidade de ministrar um antídoto bimodal às crescentes exportações chinesas. Esse antídoto compreende duas variáveis estratégicas para a futura tomada de decisão dos players europeus, a saber, a criação de um Euro Chinês e a exploração de formas de comércio pseudo intra-ramo.Relativamente à primeira variável, cabe destacar a necessidade de criar uma divisa internacional, que não o dólar chinês, que deve ser tomada, preferencialmente, pelo Governo Chinês como divisa de referência nas transacções de comércio nos diferentes mercados internacionais operados pelas empresas chinesas, isto é, o Euro chinês.

Como a melhor defesa é, de facto, o ataque, a criação mesmo que artificial dessa divisa deveria ser entendida como uma estratégia deliberada de resposta da UE face aos presentes arranjos comerciais e contratuais entre a China e os EUA, os quais se têm revelado extremamente bem sucedidos, ao nível das condições de reequilíbrio da balança comercial bilateral entre a China e os EUA, bem como ao nível da criação de mecanismos cambiais de compensação.

Na verdade, o jogo estratégico desenhado pelos players da China e dos EUA é simples e repetitivo, sendo que consiste nas seguintes jogadas: (i.) os EUA adquirem mercadorias à China; e (ii.) os Bancos da China adquirem títulos aos EUA. Em súmula, o arranjo contratual possibilita aos EUA financiarem o seu deficit externo e aumenta a procura por activos financeiros expressos em dólares. Este jogo de paridades “artificiais” entre o Dólar e o Yuan permite manter a capacidade concorrencial das empresas dos EUA. Na verdade, sugere-se uma cópia, mas melhorada, deste esquema, a qual deve ser secundada pela outra parte do antídoto bimodal.

Assim sendo, o antídoto ficará completo com a aposta deliberada em formas de comércio pseudo intra-ramo, as quais correspondem a fluxos de comércio internacional cuja relação de troca não reflecte a existência de vantagem comparativa e envolvem por este motivo a realização de transacções, sob o signo do mesmo tipo de especialização produtiva ou comercial, para os países envolvidos.

Em termos operacionais, consiste na troca com geração de ganhos, ao nível do comércio internacional. Por exemplo, importar componentes têxteis chineses de gama média produzidos mediante a exploração de economias de escala e de taxas salariais vantajosas, em termos relativos, para a China, e exportar têxteis portugueses de gama alta, com incorporação das componentes importadas e de valor acrescentado (por exemplo: capital intangível conferido pela marca) - contudo, sem descurar a aposta deliberada na diferenciação real, na certificação da qualidade do produto/serviço exportado e no domínio efectivo dos canais de distribuição e comercialização.

Em termos reais, de facto, não existem receitas infalíveis. Em termos metafóricos, espero que o submarino português que faz a vigia da nau europeia, não se deixe afundar pelo porta-aviões chinês, que despertou, tarde, para o capitalismo. Mas quando o fez, explorou, deliberadamente, a filosofia da produtividade e da capacidade para investir directamente no estrangeiro, que está bem resguarda na cultura ancestral do disciplinado povo chinês.


In DiárioXXI, Terça-Feira, 04 de Abril de 2006

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